Crônicas Campo-Belenses – JOSÉ LUIZ , O PERNAMBUCO

NemilsPernaon Vieira de Moraes**

A troca de cidade me parece que não foi uma coisa ruim para ele; do contrário, já teria ‘puxado o carro’ ou ‘picado a mula’ como se dizem por aí; pois,quando algo em sua vida não estava dentro dos conformes,gostava de dizer para todos ouvirem:

– Vai-te embora Zé Luiz…! Repetia isso muitas vezes quando estava perdendo em rodadas de jogos de baralho na banca do Valdemar Sapateiro – ou celeiro.

“Pernambuco” é assim que meu velho amigo é conhecido na cidade onde escolheu para viver e ter amigos, construir uma família e ser feliz.

Ele vive lá até hoje, desde que trocou Belo Jardim – PE, por Campos Belos – GO.

De belo em belo teria mesmo de ser bela a sua caminhada! …

Nada melhor do que ver mamãe!

Neste ano de 2015, já tive o prazer de estar com ela por duas vezes: – em fevereiro e julho.

Na última ida à terrinha soube que essa personagem lendária ainda morava na saída da cidade sentido ao distrito do Barreirão; numa Rua que leva sua alcunha – limítrofe à Vila Baiana, bairro onde me criei e onde mora a velinha mais amada do mundo: – a minha mãe.

Sou saudosista assumido e quando me bate uma saudade de alguém, à vezes chega a doer! Foi isso exatamente que aconteceu comigo em relação ao personagem em questão.

Fazia muito calor naqueles dias, uns 40 °C na sombra arrisco em dizer; mas nada disso chegou a ser obstáculo que me impedisse de matar a saudade que sentia do amigo.

Pus os pés na estrada e fui vê-lo. Desejava muito aquele momento!…

Preocupou-me o fato de não ter agendado previamente a visita! Mas por falta de contato isso não foi possível. Eu temia não o encontrá-lo ou mesmo o encontrando, não poder me atender.

Mas, assim mesmo prossegui com o meu intento…

Sem boné o sol cozinhava meus miolos e queimava o meu corpo desprovido de protetor solar.

As rolinhas caldo – de -feijão pousadas em copas de árvores queimadas pela ação danosa do fogo provavelmente proposital, não se cansavam – com seu canto dolente – de pedir a São Pedro um golinho d’água por caridade.

Uma ponte caída na Rua do “Pernambuco” dificultou meu acesso, mas sem muita preocupação dei a volta pela BR – GO 118; e não demorei muito a ver sua casinha comprida de telhado rebaixado, coberto com telhas comuns feitas por lá mesmo, onde no passado havia uma olaria.

Estava ilhada por veículos e sucatas por todos os lados. Tirava de lá um complemento para a sua aposentadoria defasada.

Papai – Seu Natã – como era conhecido, fora um dos seus clientes: comprou uma caminhonete Ford 29, de oito cilindros à gasolina que teve de vendê-la rapidamente devido o consumo excessivo de combustível; cada acelerada sabe-se lá Deus quantos Cruzeiros iam embora; e uma C14 carroceria longa – que eu cuidava e a chamava de “garça”, por ser toda branca.

De longe o vi conversando com um amigo, balançando-se numa rede armada na sala; perpetuando a bela tradição pernambucana, que conservara até aqueles dias.

Quando abri a tranqueira da cerca de arame-farpado que dá acesso a sua residência, senti um cheiro de infância!…

Vindo de um cajueiro nativo no pátio, carregadinho de frutos que me dava o ar da graça e reportava-me ao tempo de menino; em que muitas vezes o colhia nos campos do lugar, nas primeiras chuvas; para degustá-los e também levá-los para casa.

De bermudão e sem camisa, já um pouco encurvado pelos anos e conservando uma longa barba branca e rosto comprido que nos lembra Manuelzão – o personagem de Guimarães Rosa;

Com o braço direito na tipóia devido a uma queda, levantou-se com um pouco de dificuldade da sua rede e recebeu-me com um largo sorriso no rosto que sempre cultivou, e cumprimentou-me em voz alta:

-“Tá louco gruvião!”, quanto tempo a gente não se via! Por onde andas e como vão as coisas?! E me abraçou forte e alegremente.

Ele tem muita consideração comigo e com a família Vieira de um modo geral.

Pedi-lhe um gole d’água e em seguida ofereceu-me um cafezinho onde o aceitei prontamente sem muita resistência. E a prosa fluiu ao gosto do freguês.

Dentre os temas abordados o futebol, a política e a religião não puderam ficar de fora.

Já sabia que o velho amigo fora um grande articulador político bastante atuante e influente, sendo, por várias vezes, representante dos munícipes na Câmara Municipal de Campos Belos.

E que posteriormente, contando com o seu prestígio, carisma e vasto serviço prestado a comunidade, elegera com folga, o seu filho Valderêz à Câmara Municipal; mas um trágico acidente automobilístico ceifou a vida do garoto, prematuramente.

Naquele dia fiquei sabendo que o “Pernambuco” também fora um grande atleta do futebol amador da cidade que o acolheu como um de seus filhos ilustres:

quando contou e mostrou-me algumas de suas fotos que tirou com os colegas jogadores do time “Campos Belos Futebol Clube (CBFC)”.

Com a sua permissão adicionei algumas fotos no meu arquivo pessoal.

No campo religioso também me surpreendeu bastante com suas revelações relevantes: mesmo sendo romeiro de carteirinha em excursões infindas ao santuário de bom Jesus da Lapa e professando o credo católico apostólico romano abriu as portas de sua propriedade – onde há um pequeno monte – à irmandade de outros credos religiosos que tem o costume de suplicar o seu Deus com cânticos e louvores, súplicas e orações num lugar junto à natureza;

Migrante nordestino e cidadão do mundo, Pernambuco contribuiu significativamente para o desenvolvimento de Campos Belos em seus vários aspectos: urbano, econômico, social e político.
Migrante nordestino e cidadão do mundo, Pernambuco contribuiu e contribui significativamente para o desenvolvimento de Campos Belos em seus vários aspectos: urbano, econômico, social e político.

E, que também fora um dos grandes colaboradores da Igreja Evangélica Assembléia de Deus local, por ocasião da construção do “Grande Templo” dessa referida instituição.

Como se não bastasse à sua calorosa hospitalidade e a doçura de suas palavras – na prosa prazerosa que tivemos – não me despediu vazio:

– “Leva essas rapaduras para dona Isabel – minha mãe – adoçar o café e a vida; foram feitas pelo meu garoto no assentamento onde trabalha.”

Foi muito proveitoso aquele encontro com “Pernambuco”, o amigo dos velhos e bons tempos.

Eu queria somente vê-lo e ouvi-lo, mas um assunto puxava outro e a prosa redeu que foi uma beleza; e se estendeu ainda um pouco mais com a chegada de um dos seus filhos e de uma das suas netas.

Agora com um pouquinho mais de sensibilidade vi nessa tão rápida conversa com esse pilar da sociedade Campo-Belense; a grandeza do acervo histórico de Campos Belos: na história de vida desse cidadão pernambucano e goiano.

A história desse personagem é vasta e rica…

Para ser contada com riqueza de detalhes precisaria de alguém com a habilidade de um historiador e a maestria de um romancista: para levantar dados e tecer a trama como uma boa biografia merece.

Seria bom se a sua história pudesse ser mais pesquisada e registrada em um livro para posteridade.

Sem dúvida “Pernambuco” contribuiu e contribui significativamente para o desenvolvimento do lugar em seus vários aspectos: urbano, econômico, social e político…

E se fez grande com a grandeza do povo da cidade que escolhera para viver a maior parte de sua existência terrena e que aprendeu a amar de coração!

Migrante nordestino e cidadão do mundo; mas acima de tudo campo-belense de coração.

Segundo seu próprio relato em vídeo, conheceu Campos Belos com sessenta casas residenciais. Hoje tem algo em torno de vinte mil habitantes.

Representou a comunidade de Campos Belos por quatro mandatos como um dos Vereadores mais votados;

Foi o primeiro motorista habilitado da cidade; o primeiro mecânico e sanfoneiro; e primeiro proprietário de veículo automotor da região;

Atuou como atleta amador do primeiro time de futebol da terrinha “Campos Belos Futebol Clube”;

E atuou como um dos primeiros Atores Sociais de grande relevância.

Foi homenageado pelo Radialista e Servidor da Segurança Pública, Ivan de Almeida, no programa “Cidade Em Foco” da Rádio Atividade FM de campos Belos do dia 02.04.2016.

E para alindar ainda mais o evento esteve presente in loco na emissora o escritor e poeta professor Manoel, que produziu dois textos: um biográfico – lido inicialmente por Ivan Almeida; e um poético – também sobre “Pernambuco” lido pelo próprio autor.

Como ouvinte dessa magnânima programação restou-me, parabenizar toda a “Produção” da Rádio pela condução das pautas em voga e por essa brilhante idéia de registrar formalmente em produções literárias a história de vida dos cidadãos que se destacaram no enlevo sociocultural da cidade.

Fora uma linda homenagem que me emocionou bastante!  É sem dúvida uma plausível iniciativa: homenagear os guerreiros que protagonizaram a história de Campos Belos – GO, e que nos enche muito de orgulho de saber o quanto foram importantes na construção de um mundo melhor para as gerações atuais e futuras.

A grandiosidade e à riqueza interiorana está em seus recursos naturais, em seus ecossistemas e em sua biodiversidade; na diversidade sociocultural, na generosidade e na história de sua gente.

 

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** Nemilson Vieira de Moraes  –  Membro Efetivo da Academia Nevense de Letras Ciências e Artes (ANELCA), no seguimento literário desde 30.10.2015; titular da cadeira n° 03 do cujo Patrono é J. G. de Araújo Jorge; É escritor, poeta e contista. É coautor de várias Antologias: dentre elas estão incluídas o “Concurso Nacional de Poesias” (Poetize 2016) e a 1° Edição “Em Prosa e Versos 2015”, da Academia de Letras do Brasil (ALB) – MG/RMBH; Formado em Educação Teológica e Técnico de Enfermagem com Especialização em Técnico de Enfermagem do trabalho; Graduado em Gestão Ambiental pelo Centro Universitário UNA-BH/MG. Atua também como Micro Empreendedor Individual. Atualmente cursa “Extensão Em Educação Ambiental” na Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Belo Horizonte – MG.

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5 comentários em “Crônicas Campo-Belenses – JOSÉ LUIZ , O PERNAMBUCO

  • 9 de abril de 2016 em 14:11
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    Nessa brilhante narrativa só faltou falar que ele têm 11 filhos registrados, 21 netos e 06 bisnetos! Realmente meu avô tem uma história linda!

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    • 9 de abril de 2016 em 14:48
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      Muitos dados sobre este valoroso companheiro ainda precisam ser publicados, prezada Julliana. O autor da Crônica, Nemilson Vieira, foi muito feliz com essa breve narrativa. Grato por seu comentário.

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  • 11 de abril de 2016 em 2:07
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    Parabenizo pela matéria sobre “Pernambuco”. Certamente, ele é um arquivo vivo das memórias sobre Campos Belos, minha cidade natal. Creio que já era tempo da Prefeitura local criar uma secretaria de cultura e poder catalogar registros importantes, ainda em tempo, com pessoas históricas, como José Luís (Pernambuco). Eu o conheci quando criança, aos 9 anos de idade, quando ele era motorista do primeiro prefeito da Cidade Francisco Xavier “Xico Xavier” e possuía um apelido “Perna” (Perna de Pernambuco). Viajei com ele, aos 11 anos de idade, a uma romaria em Bom Jesus da Lapa. Fui com o meu pai, Pedro dos Santos, casado com Messias Oliveira Santos, comerciante, um dos pioneiros de Campos Belos, tendo construído a nossa casa na Rua Sete de Setembro n° 54. O prefeito Xavier anualmente levava o seu Chevrolet lotado de romeiros e, numa dessas viagens, cruzamos o rio São Francisco na busca de um milagre, seguindo a rota Campos Belos, Barreiras, Angical, Sítio do Mato, às margens do São Francisco, até Bom Jesus da Lapa. Lembro-me também quando Pernambuco tomou posse como vereador de Campos Belos, na década de 1950. E ainda quando namorava com minha parenta Arisneide. Certa vez, ao retornar de uma viagem a Goiânia, onde reformou o seu Chevrolet, com uma mensagem no para-choque: “Chegou quem eu esperava”, frase comentada por todos anos após. Certamente que Pernambuco é uma figura histórica e amado por todos em Campos Belos.
    Isvaldino Oliveira dos Santos – Jornalista, pastor e morador em Belo Horizonte (MG)

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  • 11 de abril de 2016 em 2:18
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    Quero fazer uma pequena correção em meu comentário acima, ressaltando que o primeiro prefeito de Campos Belos foi Temístocles Rocha (1954-1955) e que Francisco Xavier Oliveira foi o segundo (1955-1959) e o quarto prefeito de Campos Belos (1961-1966).

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  • 11 de abril de 2016 em 16:47
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    Bom texto e bom tema.
    Pernamubco é mesmo uma dessas figuras simbólicas de Campos Belos.

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