Larissa Cardoso Beltrão: LITERATURA E INTERATIVIDADE NO CIBERESPAÇO: A POÉTICA DE ARNALDO ANTUNES

Em entrevista concedida ao Valor Econômico (SP)   o professor Mozart Neves Ramos (2015)Neves Ramos (2015), afirma que  diante das novas possibilidades de leitura e escrita, no ciberespaço, surge a necessidade de termos professores preparados para lidar com essa sociedade em mudança.

Como ele mesmo afirma, é impossível que uma escola do XIX, com professores do século XX dialogue com alunos do século XXI, ambientados em uma realidade que sugere, o tempo todo, a cibercultura.
Com o advento das novas tecnologias o mundo digital permitiu uma maior aproximação entre literatura e leitor. Nesse contexto, a literatura exerce um papel muito importante na sociedade, ela concebe a humanização, a criticidade, forma cidadãos conscientes e capazes de decifrar seus próprios anseios, Antonio Candido (2004) diz que a literatura é indispensável na vida do homem:
Não há povo e não há homem que possa viver sem ela, isto é, sem a possibilidade de entrar em contato com alguma espécie de fabulação. Assim como todos sonham todas as noites, ninguém é capaz de passar as vinte quatro horas do dia sem alguns momentos de entrega ao universo fabulado. O sonho assegura durante o sono a presença indispensável deste universo, independentemente de nossa vontade. E durante a vigília a criação ficcional ou poética, que é a mola da literatura em todos os seus níveis e modalidades, está presente em cada um de nós, analfabeto ou erudito – como anedota, causo, história em quadrinho, noticiário policial, canção popular, moda de viola, samba carnavalesco. (…) Portanto, assim como não é possível haver equilíbrio psíquico sem o sonho durante o sono, talvez não haja equilíbrio social sem a literatura. Deste modo, ela é fator indispensável de humanização e, sendo assim, confirma o homem na sua humanidade, inclusive porque atua em grande parte no subconsciente e no inconsciente. (CÂNDIDO, 2004, p. 174-175).

1Graduada de Letras – Português/Inglês da Universidade Estadual de Goiás – Campus Campos Belos e Pós-graduanda da especialização latu senso Linguagens, letramento e cibercultura na educação básica, pela mesma universidade. E-mail: alvesjulianapereira@gmail.com
1Mestre em Letras e Linguística pela Universidade Federal de Goiás (UFG). Professora do curso de Letras e da Pós-graduação em Linguagens, letramento e cibercultura na educação básica, ambos da Universidade Estadual de Goiás – Campus Campos Belos. E-mail: laricinhabeltrao@hotmail.com
1Entrevista disponível em: http://www.todospelaeducacao.org.br/educacao-na-midia/indice/32954/escola-do-seculo-xix-nao-consegue-atrair-jovens/

Diante desse processo de humanização que a literatura proporciona, destacaremos a produção poética, que na contemporaneidade encontrou novas possibilidades de escrita e, por conseguinte, de leitura. A poesia, na contemporaneidade, ocupa um espaço muito importante, em interação e parceria com outros mecanismos – som e imagem – tem alcançado novos horizontes:
As novas tecnologias e as suas capacidades não devem ser tomadas apenas como novos meios para realizar, de uma maneira diferente, velhas experiências e descobertas. Elas abrem, sim, novas possibilidades e perspectivas para o trabalho inventivo do poeta, na descoberta de novas poéticas do verbal e não-verbal, ao encontro das aberturas perceptivas do contemporâneo e das suas vertiginosas problemáticas vivenciais. (CASTRO, 2006, p.117).
As novas tecnologias e as suas capacidades não devem ser tomadas apenas como novos meios para realizar, de uma maneira diferente, velhas experiências e descobertas. Elas abrem, sim, novas possibilidades e perspectivas para o trabalho inventivo do poeta, na descoberta de novas poéticas do verbal e não-verbal, ao encontro das aberturas perceptivas do contemporâneo e das suas vertiginosas problemáticas vivenciais. (CASTRO, 2006, p.117).

E nessa perspectiva, defendida por Ernesto Manuel Castro, a das novas possibilidades de leitura, destacaremos, a partir de agora, a poesia de Arnaldo Antunes, considerado um dos percursores desse estilo poético contemporâneo, que mescla palavra, som e imagem. Compositor e poeta, Arnaldo Antunes tem a sua carreira marcada por modalidades artísticas diversas, uma vez que ele é músico, poeta, pintor, artista plástico.
Começou sua carreira como integrante do grupo Titãs, depois optou pela carreira solo. Atualmente é dos autores contemporâneos de grande relevância para a literatura, suas obras são acessíveis a todos os públicos que vai desde o infantil até a mais tenra idade. Usando sempre a simultaneidade das palavras, sons e imagens proporciona a seus leitores o acesso à uma produção extremamente moderna, marcada pela hibridização.
A poesia de Antunes funciona basicamente como um espelho da sociedade possibilitando ao leitor a sensações de se auto-descobrir. Durante a leitura, o leitor é instigado a rever seus conceitos e vivenciar seus sentimentos e experiências do cotidiano. Em seu site oficial na internet “Arnaldo Antunes Já é”, o usuário tem acesso a vários links que disponibilizam grande parte de seus trabalhos, sendo acessível a qualquer público que navegue pela internet.
Como verificamos na imagem acima, ao acessar a página do poeta, é possível navegar por sua produção artística. Outro aspecto que devemos destacar, no canto direito da tela há um link que redireciona o leitor para a página do Facebook, ambiente no qual, além de ler os escritos do autor, é possível interagir com outros leitores, visto que nesta rede ele tem 640.487 (seiscentos e quarenta mil e quatrocentos e oitenta e sete) seguidores.
Como dissemos anteriormente, ao clicar no link que redireciona para o Facebook, o leitor que, em instantes estava num site, é (re) direcionado para a uma rede social, espaço no qual estará diante de novas possibilidades de leitura. No print acima, por exemplo, temos além de poesia e (auto) imagem, a possibilidade de ouvir uma composição sonora, como vemos na expressão: Ouça “Se assim quiser”, seguida por um mais um link de acesso.
Caso opte por navegar pela página do autor, ao clicar, também no canto direito em “ir para o site”, o leitor se deparará com a seguinte imagem:
4 Print, embora considerado um estrangeirismo, tem se tornado um termo comum na Língua Portuguesa. Tirar um print é criar uma imagem mostrando o que se vê na tela do computador, ou do celular, em dado momento.
Na parte superior da página diversos links que reportam o (hiper) leitor para: desde sua biografia, até os contatos do artista. Devemos destacar ainda que o design do site, por si só, já pode ser considerado interativo, haja vista que podemos considerá-la uma página “animada”. Na figura nº 1, por exemplo, quando vista na rede temos a fumaça exalando da xícara. O mesmo acontece com a Figura nº 2 que, quando acessada, é marcada pela sobreposição de imagens do artista.
Algumas de suas obras são publicadas em livro, CD e DVD, como é o caso do livro As Coisas (1991), sua quarta publicação. Foi escrito por e ilustrado por sua filha Rosa Moreau Antunes (com três anos de idade), esta obra foi contemplada com o prêmio Jabuti de poesia em 1992.

Como vemos na imagem acima, a parceria entre Arnaldo Antunes e sua filha sugere uma diversidade de público, uma vez que faculta a interação entre crianças e adultos. Diante do cenário de transformação, Umberto Eco (2003) teorizou sobre a construção do leitor literário ideal, cujo modelo aponta, exatamente, para formação humanística de adultos, jovens e crianças. Ao discutir o papel do leitor no texto literário, Eco versa sobre sua incompletude.
Segundo ele, o texto é incompleto porque pressupõe a existência de um destinatário, reiterando a afirmação de Antonio Candido (2004), para quem, os fatores sociais exercem influência concreta na manifestação artística, pois ao analisarmos a arte, enquanto um sistema simbólico de comunicação inter-humana, podemos verificar a existência de uma relação pertinente entre artista, obra e público.
Acreditamos, portanto, que diante da realidade de um novo espaço – o ciberespaço – bem como das novas possibilidades de escrita – o hipertexto – vimos surgir um novo perfil comportamental, tanto de quem lê – o (hiper) leitor – quanto de quem, na contemporaneidade, escreve. Ao destacar a poética de Arnaldo Antunes, objetivamos apresentar, tanto ao leitor comum, quantos aos professores, as possibilidades que a poesia na rede nos oferece, uma vez que, hoje, temos a literatura ao alcance das mãos. A partir de um click é possível acessar uma infinidade de textos: escritos, visuais e sonoros.
Voltando à entrevista de do professor Mozart Neves Ramos (2015), que possui grande experiência na área educacional, é preciso observar que ele fez uma série de apontamentos sobre o novo perfil de aluno/leitor que surge a partir do ciberespaço. A possibilidade de acesso rápido à informações diversificadas faz com que, na escola, professor e aluno, por vezes, troquem de lugar. De acordo com ele, na nova ordem mundial, é impossível pensar numa relação centralizadora, na qual o aluno permanece sentado e o professor, detentor do discurso, passe de duas a três horas falando.
Nesse contexto, ao se pensar no perfil de aluno que surge neste cenário acreditamos, pois, que, ao fomentar a (hiper) leitura, a escola está indo ao encontro das novas necessidades que surgem a partir dessa relação. Fazer a internet, bem como das redes sociais, espaço de interação entre escritor e (hiper) leitor proporciona ao aluno um contato não estabelecido até então. A possibilidade de interagir, através da rede, com o escritor coloca essa relação – escritor, obra e público – em um outro patamar. Uma vez que, fomentar essa relação de proximidade com o novo pode ser uma porta de abertura para uma introdução, contextualizada, das obras do cânone. Ao ler, por exemplo, um soneto escrito por Arnaldo Antunes, disponível em sua página do Facebook, o jovem leitor pode sentir vontade de pesquisar sobre a origem e a forma do poema e, possivelmente, algum link o levará a, saber sobre, Camões.
REFERÊNCIAS

ANTUNES, Arnaldo. As coisas. 8ª Edição. São Paulo: Ed. Iluminuras, 2002.

http://www.arnaldoantunes.com.br/jae/index.html/ <Acesso em 03 de dezembro de 2016>

https://www.facebook.com/arnaldo.antunes/ <Acesso em 03 de dezembro de 2016>

http://www.todospelaeducacao.org.br/educacao-na-midia/indice/32954/escola-do-seculo-xix-nao-consegue-atrair-jovens/ <Acesso em 15 de novembro de 2016>

BAGNO, Marcos. Língua materna: letramento, variação & ensino. São Paulo. Parábola, 2002.

CANDIDO, Antonio. O direito à literatura. In: Vários escritos. 4ª ed. São Paulo/Rio de Janeiro: Duas Cidades/Ouro sobre Azul, 2004.

ECO, Umberto. Sobre algumas funções da literatura. In: Sobre a literatura. 2ª ed. Rio
de Janeiro: Record, 2003.

LÉVY, Pierre. As tecnologias da Inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Trad. Carlos Irineu da Costa. Rio de Janeiro: Editora 34, 1993.

______. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999;
MARCUSCHI, Luiz Antônio. O hipertexto como novo espaço de escrita em sala de aula. In: Linguagem e Ensino, vol. 4, nº 1, 2001.

MORIN, Edgar. A cabeça bem feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. trad.Eloá Jacobina.8ed.Rio de Janeiro: Bhertrand Brasil,2003.
SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Trad. Claúdia Schilling-6. ed. Porto Alegre: Art med, 1998.

XAVIER, Antônio Carlos. Leitura, texto e hipertexto. In: MARCUSCHI & (orgs). Hipertextos e Gêneros Digitais. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

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