ELEIÇÕES 2016 – Gasto vai superar teto nas pequenas cidades, prevê presidente do TSE.

Em 68% dos municípios, vereador só pode gastar R$ 10,8 mil na campanha. Para presidente do TSE, será maior o risco de anulação de resultados.

Renan Ramalho e Mariana Oliveira**

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, afirmou em entrevista ao G1 que, em razão dos novos limites de gastos das campanhas eleitorais definidos no ano passado pelo Congresso Nacional na minirreforma eleitoral, prevê uma “notória extrapolação” do teto de gastos estipulado para a eleição municipal de outubro.

Em 68% dos municípios, que têm menos de 10 mil eleitores, o teto de gastos nas campanhas será de R$ 10,8 mil para candidatos a vereador e R$ 108 mil para candidatos a prefeito. Em cidades maiores, o teto foi definido com base na última eleição municipal, de 2012 (entenda aqui).

Para inibir, coibir e punir irregularidades no processo eleitoral, Gilmar Mendes buscou reforçar a capacidade de fiscalização do TSE. -  Foto: Roberto Jayme/ASICS/TSE
Para inibir, coibir e punir irregularidades no processo eleitoral, Gilmar Mendes buscou reforçar a capacidade de fiscalização do TSE. – Foto: Roberto Jayme/ASICS/TSE

A legislação prevê, em caso de descumprimento dos tetos das campanhas, que os candidatos eleitos com comprovado abuso de poder econômico percam os mandatos.

Gilmar Mendes tem alertado para o risco de aumento do número de ações judiciais buscando anular o resultado das eleições devido ao estouro desses limites.

“No caso em que o teto é muito restritivo, notoriamente, haverá extrapolação”, destacou o ministro ao G1.

“Esses números [valores limites para as campanhas], dependendo das peculiaridades de cada município, são baixos. E, certamente, haverá, de alguma forma, tentativas ou propósitos de fugir a esse teto. E haverá acusações recíprocas de que um ou outro [candidato] terá violado o teto e isso constitui abuso de poder econômico, por exemplo”, pondera Gilmar Mendes.

“Como vamos fazer campanha com esse teto? Até tenho observado que, no caso desses R$ 10 mil, vamos ter campanhas talvez muito ecológicas porque talvez não se possa nem usar um automóvel, mesmo nesse período curto de campanha”, ironizou.

Diante do teto baixo para as campanhas, o magistrado avalia que devem ocorrer um grande número de impugnações. “Os perdedores das eleições, aqueles que identificarem esses sinais abusivos de recursos, de riqueza, vão trazer isso para os autos”, observa Mendes.

O ministro destaca ainda que as campanhas deverão ficar mais baratas devido ao enxuto teto de gastos, mas também pelo fato de que a campanha eleitoral deste ano será menor. Até então, as eleições se estendiam por 3 meses, porém, a partir deste ano, a campanha irá durar 1 mês e meio.

Outro fator que deve minguar o orçamento das campanhas eleitorais de 2016, avalia o magistrado, é o efeito das investigações da Operação Lava Jato. A prisão de políticos, dirigentes partidários, empresários e marqueteiros praticamente secou, nos últimos meses, as doações para partidos e candidatos.

Resultados provisórios
Gilmar Mendes afirma que o aumento do número de contestações judiciais também poderá levar ao que se chama de “resultados provisórios” da eleição.

Segundo ele, haverá proclamações de candidatos eleitos que, posteriormente, vão ser revistas tanto no caso dos candidatos majoritários, de prefeitos, quanto no caso dos candidatos a vereadores.

O resultado das eleições será também um provisório. Nós vamos ter proclamações que depois vão ser revistas, tanto no caso dos candidatos majoritários, de prefeitos, quanto no caso dos candidatos a vereadores”
Gilmar Mendes
A eventual anulação da eleição de um vereador pode alterar toda a composição da Câmara Municipal, alerta o ministro, na medida em que o partido dele perderá as cadeiras conquistadas com os votos que obteve. Já a anulação da eleição de um prefeito obriga a Justiça Eleitoral a convocar novas eleições.

“Eu não conto com uma redução da sobrecarga da Justiça Eleitoral como um todo nem do TSE. Ao revés, eu espero que haja um aumento tendo em vista essas peculiaridades”, enfatizou.

Com o período mais curto de campanha, aponta o ministro, também diminui o tempo disponível para a Justiça Eleitoral analisar as contas adequadamente.

Maior fiscalização
Para inibir, coibir e punir irregularidades no processo eleitoral, Gilmar Mendes buscou reforçar a capacidade de fiscalização do TSE. O número de técnicos que fazem a conferência da prestação de contas de candidatos e partidos subiu de 12 para 34 servidores.

O presidente do tribunal, entretanto, aposta que a integração da Corte eleitoral com outros órgãos de fiscalização, como Receita Federal, Banco Central, Tribunal de Contas da União e Polícia Federal deve auxiliar ainda mais no controle de irregularidades eleitorais.

O objetivo desta parceria é cruzar dados que possibilitem, por exemplo, identificar pessoas que contribuam acima do limite legal ou prestadores de serviço sem capacidade de executar os serviços.

O primeiro caso pode revelar indícios de que uma determinada empresa pode estar financiando uma campanha por meio de um “laranja”. Já a segunda situação pode mostrar irregularidades na declaração de partidos e candidatos sobre o destino dos recursos captados para a campanha.

“Além do problema da forma de captação de recursos, vimos também que havia uma inautenticidade quanto aos gastos declarados. E aí é uma questão realmente delicada. O partido declara um gasto para uma dada finalidade e, claramente, não verteu esses recursos para essa finalidade”, explica o ministro.

Nesse caso, a fiscalização pode revelar que o dinheiro pode estar sendo usado para a compra de eleitores ou de alianças partidárias ou até mesmo o enriquecimento ilícito de um candidato.

“Não nos resta nada a fazer a não ser aplicar a lei da melhor forma e estamos fazendo isso com a maior convicção. Estamos engajados e buscando apoio de todas as instituições para coibirmos abusos. Mas, certamente, diante de todo esse quadro, a limitação de gastos, a dificuldade de financiamento, nós temos que contar com tentativas de fraudes, de abusos. É natural que nós estejamos preocupados com isso”, disse Gilmar Mendes.

Reforma política
Na entrevista ao G1, Gilmar Mendes ressaltou que, na opinião dele, há a necessidade de, concluída as eleições municipais, ser feita uma revisão do atual sistema eleitoral do país, incluindo as formas de financiamento de campanhas.

Na visão do presidente do TSE, as atuais regras do jogo político se distanciaram do mínimo de “realidade institucional”. Ele considera que as alterações pontuais ao longo do tempo levaram à multiplicação de partidos sem autenticidade junto à sociedade.

Nós discutimos primeiro o financiamento sem prestar atenção no sistema eleitoral. Não alteramos nada no sistema eleitoral e decidimos mudar o financiamento […] Nós temos agora que aguardar o resultado dessa campanha e ver também se na reforma política haverá a revisão do sistema eleitoral”
Gilmar Mendes. No ano passado, Gilmar Mendes votou, em um julgamento no Supremo Tribunal Federal(STF), contra a proibição de empresas fazerem doações eleitorais.

Na ocasião, a maioria dos ministro da Suprema Corte determinou que, a partir das eleições deste ano, somente pessoas físicas poderiam colaborar financeiramente com as campanhas. Para Gilmar Mendes, o tribunal colocou “o carro na frente dos bois”.

“Porque nós discutimos primeiro o financiamento sem prestar atenção ao sistema eleitoral. Não alteramos nada no sistema eleitoral e decidimos mudar o financiamento”, reclama o magistrado.

“Nós temos agora que aguardar o resultado dessa campanha e ver também se na reforma política haverá a revisão do sistema eleitoral.”

O presidente do TSE destaca que uma das opções de mudança nas regras eleitorais em discussão no país é a adoção do modelo alemão. No sistema germânico, metade das vagas de uma câmara municipal, de uma assembleia legislativa e também da Câmara dos Deputados é preenchida por políticos eleitos em distritos – subdivisões do município ou do estado. Assim, cada parlamentar distrital representaria só aquela região.
Nesse mesmo modelo, a outra metade das vagas é preenchida proporcionalmente ao número de votos que o partido obteve em todo o município ou estado. Seriam eleitos, no entanto, só os políticos previamente escolhidos pela legenda numa ordem de preferência.

“Se nós vamos para um sistema de lista fechada, ainda que adotar o modelo misto alemão com divisão dos distritos, a campanha fica fortemente concentrada no partido. E o partido faz a campanha dos candidatos. Nesse caso não é difícil até pensar num modelo misto de financiamento: fundos públicos com algum tipo de recurso privado, com alguma limitação. É possível se fazer esse tipo de especulação. Mas tudo depende do sistema eleitoral”, ponderou.

O problema do atual modelo político e eleitoral, avalia Gilmar Mendes, é que os candidatos de uma mesma legenda disputam as vagas no Legislativo entre si em todo o estado ou município, o que também contribui para o aumento do custo das campanhas, não raro alimentadas com dinheiro não declarado – o chamado caixa 2 – oriundo de propina ou do crime organizado.

Outras mudanças, já discutidas pelo próprio Mendes com senadores, buscam reduzir o número ou pelo menos tirar força de pequenas legendas. Neste rol, há propostas em estudo no Congresso para a volta da cláusula de barreira e o fim das coligações (entenda mais aqui).

Nesta quarta-feira (27), o presidente nacional do PSDB, senador Aécio Neves (MG), foi ao Palácio do Planalto pedir o apoio do presidente em exercício, Michel Temer, para aprovar no Congresso Nacional dois projetos que integram uma das propostas de reforma política em tramitação no parlamento.

Um dos textos que Aécio quer obter o aval do governo determina a criação de um cláusula de barreira para os partidos terem representação no Legislativo. O outro proíbe as coligações partidárias nas eleições proporcionais (para eleição de deputados e vereadores).

**Do G1 e da TV Globo, em Brasília.

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