Saiba se você tem esclerose múltipla e como tratar a doença
Por Paulo Porto de Melo*
Muito se tem discutido ultimamente sobre esclerose múltipla devido às recentes notícias envolvendo a atriz Cláudia Rodrigues, que fez um desabafo emocionado em entrevista ao programa “Domingo Espetacular”, da Record.
“Comecei a gravar e dizia: pera aí, pera aí, só um minuto. E a direção me chamou e disse: “O que está acontecendo?”, revelou Cláudia. O desespero acabou levando a atriz a pensar em suicídio. “Pensei em até tirar a minha vida, como meu irmão tirou. Pensei”, contou.
Um entendimento correto a respeito da esclerose múltipla ajuda a derrubar preconceitos e promove uma saudável discussão na sociedade, ajudando na obtenção de diagnósticos mais precoces e tratamentos mais eficientes. Se não sabemos nem do que se trata, como então desconfiar que algo está errado e que há tratamento disponível?
O que é?
A Esclerose Múltipla é uma doença neurológica, que se manifesta devido a danos em uma estrutura chamada mielina. A mielina é como se fosse um “isolante” do cérebro, da medula e dos nervos, pois ele propicia que as informações sejam transmitidas com clareza, precisão e rapidez.
Por algum mecanismo ainda desconhecido, mas com forte participação do sistema imunológico, as células de defesa do nosso próprio organismo começam a atacar a mielina e danificá-la. O processo de reparação natural do nosso corpo leva à formação de uma cicatriz (também chamada de esclerose, daí o nome da doença). Esta cicatriz não possui as mesmas propriedades da mielina e portanto não confere o isolamento necessário aos axônios dos neurônios (espécie de fios condutores das informações), levando a transmissão de informações distorcidas ou com muita lentidão. Algumas vezes o dano é tão grande que a informação nem sequer é transmitida.
“Apesar de não ser uma doença puramente genética, a ciência mostra que existem indivíduos geneticamente predispostos a desenvolver os sintomas. Uma série de fatores ambientais (alguns dizem que fatores infecciosos também influenciam) agem como ‘gatilho’, que desencadeiam a resposta imunológica alterada e o aparecimento dos sintomas”
E que informações são estas? Praticamente tudo que nos permite interagir com o mundo ao nosso redor: informações sensitivas (se um objeto está quente ou frio, áspero ou liso, macio ou duro, etc), informações motoras (o comando que o cérebro envia para que os braços ou as per- nas se movam, por exemplo, é transmitido por essas vias) e informações visuais (após a imagem ser capturada pelos olhos, é transmitida para ser interpretada pelo cérebro pelos nervos ópticos).
A ciência nos indica também que a chance de desenvolver esclerose múltipla é maior em mulheres e em indivíduos caucasianos (com biótipo europeu).
Os sintomas da esclerose múltipla são diversos, como o próprio nome sugere. Os mais comuns são fadiga, dormência na face ou nos membros, dificuldades para caminhar, vertigem e tontura, vi- são turva, fraqueza (perda de força muscular localizada) e depressão.
São sintomas muito comuns e somente algumas características muito específicas de cada um deles pode levar seu médico a desconfiar de esclerose múltipla.
A fadiga, tontura e outros sintomas são muito frequentes em nossa população, o que não quer dizer, necessariamente, que se suspeite de acometimento pela doença.
A esclerose múltipla é uma doença rara (cerca de 0.1%), sendo muito menos frequente do que outras causas para fadiga, tontura, etc.
O diagnóstico de esclerose múltipla é feito através da história clínica, das alterações presentes no exame neurológico e de exames complementares como a ressonância magnética, o exame de liquor e de potenciais evocados.
Tratamento
Existem várias formas de tratamento com bons resulta- dos. Usualmente os sintomas melhoram bastante e são utilizados remédios na fase aguda da doença, para impedir maiores danos e recuperar as funções perdidas durante a crise, e outros na chamada fase de manutenção, que tem como objetivo diminuir a chance de uma nova crise.
Além do tratamento medicamentoso, é fundamental o acompanhamento com fisioterapia (para acelerar a recuperação dos déficits) e psicologia (para apoio durante o curso da doença e elaboração da melhor forma de lidar com possíveis limitações).
*Dr. Paulo Porto de Melo é neurocirurgião formado pela UNIFESP, especialista em Neurocirurgia pela Sociedade Brasileira de Neurocirurgia e colaborador do Departamento de Neurocirurgia da Universidade de Saint-Louis (EUA).