REPORTAGEM ESPECIAL – Falta de transparência no uso de recursos, disputas por terras e interesses políticos geram clima de ódio entre descendentes de quilombolas no nordeste goiano.
Clima esquentou quando vídeos com denúncias feitas por lideranças quilombolas foram divulgados em redes sociais. Acusações são direcionadas para as Associações que comandam o território Kalunga, que por sua vez, negam qualquer tipo de irregularidade. O Jornal O VETOR foi em busca de depoimentos de todos os envolvidos, inclusive os Ministérios Públicos Estadual e Federal.
Roberto Naborfazan
Os descendentes de escravos, moradores do centenário território Kalunga existente no nordeste goiano, que abrange os municípios de Teresina de Goiás, Monte Alegre de Goiás e Cavalcante, estão enfrentando atualmente uma situação que remete aos tempos de sofrimentos vividos por seus antepassados, com o agravante de existir forte divisão entre eles próprios.
O contexto até agora apresentado conta com a participação de órgãos governamentais em todas as esferas, que se envolveram em questões pessoais e patrimoniais no território, em suposto interesse de proteção ao meio ambiente, que agora se transforma em uma guerra entre irmãos, com acusações de alteração de marco territorial, roubos, invasão de terras, depredação, escravidão e até ameaças de morte.
Esses mesmos órgãos governamentais que, segundo denúncias, se deixaram envolver em situações que prejudicaram grande parte dos Kalungas daquela parte do estado, estão deixando o conflito tomar proporções que podem levar a consequências desastrosas dentro da comunidade quilombola da região e estão agindo como Pilatos, lavando as mãos, ao invés de buscar interceder e ajudar a encontrar um caminho para que se cesse o conflito.
As fortes chuvas que caíram na região neste inicio de ano, além de destruir estradas, provocar enchentes em córregos e rios, isolando centenas de famílias, trouxeram à tona graves acusações feitas por várias lideranças Kalungas moradoras nos municípios de Cavalcante, Teresina de Goiás e Monte Alegre de Goiás.
A revolta se iniciou quando uma pessoa postou um vídeo em uma rede social, pedindo que o governo de Goiás ampliasse o auxilio com cestas básicas para moradores de uma parte da comunidade residente no Vão do Moleque, afirmando que estavam passando fome.
Isso desencadeou uma série de respostas, também através de vídeos, vindas de pequenos produtores que moram e produzem alimentos básicos em suas glebas. Em suas respostas, eles afirmam que só está passando fome quem está parado no tempo, esperando benefícios de governos, e não trabalhou suas pequenas posses para o plantio e colheita de agricultura de subsistência, ou aqueles que estão sob o domínio de associações que não permitem o plantio que não seja em roça de toco, direcionado o debate para uma polêmica que envolve associações quilombolas e órgão públicos municipais, estaduais e federais.
Quem primeiro se posicionou com firmeza sobre a questão foi Bertolino Moreira Dias, conhecido como Boto, uma das grandes lideranças na região do Vão do Moleque, que repudiou quem vive de pedir cestas básicas, frisando que, se as autoridades querem ajudar as comunidades quilombolas, que permitam que as pessoas trabalhem em suas terras e doem tratores, máquinas e implementos agrícolas, e permitam que possam trabalhar e produzir alimentos para sua subsistência e comercialização.
No vídeo, Boto afirma que algumas associações têm recebido dinheiro em nome dos quilombolas, mas não prestam contas e que o dinheiro fica limitado á poucas pessoas. Ele faz ainda outras fortes denúncias. Assista aos vídeos.
Outro depoimento, e um dos mais contundentes, vem do senhor Juarez Aquino. Ele afirma com muita segurança que grupos de pessoas (que ele chama de bandidagem) articularam manobras, alterando marcos territoriais no Vão do Moleque, Vão de Almas e Engenho II, transformando em território quilombola terras escrituradas ou titularizadas de pequenos produtores, que agora não podem mais fazer nenhum tipo de ampliação, gradear ou arar suas terras, pois estão sujeitos a multas e até a prisão.
Juarez Aquino cita que há anos pessoas vêm se aproveitando de Associações para desviar recursos destinados à benefícios para as terras transformadas em território quilombola. Assista aos vídeos.
O que se denuncia é que desde que acabou a individualidade na posse das terras, e as associações passaram a gerir os interesses coletivos, é que as famílias moradoras no território se tornaram reféns de normas repressoras, como não poderem plantar ou criar seus animais em determinadas áreas, que todo o dinheiro arrecadado com a exploração do turismo é controlado pelas associações, mais falta transparência na prestação de contas, e que até para construir uma casa ou dar parte de seu lote para um filho ou parente, o morador precisa passar pelo crivo severo dos diretores das associações, tendo que preencher formulários que só são aprovados se houver interesse e bom relacionamento com os dirigentes.
O Jornal O VETOR recebeu denúncias de que, quem se aventura em denunciar irregularidades, ou se contrapor as normas estabelecidas pelas associações, sofre ameaças e represálias. Há também denúncias de que as associações gastam volumosa quantia do dinheiro arrecadado através de doações para contratar experientes advogados para os defenderem e processar quem os contraria.
Em áudio enviado à reportagem do Jornal O VETOR, a senhora Olinda Abreu diz que é moradora em Cavalcante a trinta e oito anos, e que já foi vítima de ações judiciais por questionar e apontar irregularidades de diretores de uma das associações.
“Os descendentes de quilombolas que habitam o território estão revoltados. Eles estão falando a verdade, pois estão sendo escravizados. Quando fizeram a primeira associação, ela era somente para os moradores no Vão de Almas, em Cavalcante, e em Contenda, no município de Monte Alegre de Goiás. Mais tarde, quando o senhor Vilmar Souza Costa assumiu essa associação, e não sei como eles fazem a votação para eleger a diretoria, porque a maioria dos quilombolas do Vão de Almas e do Vão do Moleque não sabe como essa votação é feita, passou a tudo ser feito as escondidas, não há transparência em nada. Eles chegam a tomar terras dos outros, eu mesma tive dois barracões, que fiz em minhas terras, queimados por eles. Eu estava hospitalizada em uma UTI e eles me acionaram na justiça, querendo tomar minhas terras. Fui processada duas vezes pelo senhor Vilmar Souza Costa por falar a verdade. Eles falam que o dinheiro é para ajudar os quilombolas em suas necessidades, mas já perdi quatro amigos por falta de assistência. A última vez foi uma amiga que precisava de 600 reais para ser transportada para Goiânia, para não morrer a míngua, eles não deram, argumentando que o dinheiro arrecadado nas cachoeiras tinha outras necessidades. Eles fazem todo esse processo em terras alheias. A minha, por exemplo, faz limite com a Cachoeira Santa Bárbara, eles não me pedem permissão para usar minhas terras e não me dão um centavo. A maioria das Cachoeiras que eles exploram estão em terras dos outros, que eles anexaram a associação. Se reclamar, eles ameaçam, falam que vão matar a gente. Isso quem faz são os dirigentes das associações, e não os quilombolas. Depois que um grupo liderados pelo Vilmar Souza, um senhor chamado Durval (Mota), que era funcionário do antigo IDAGO, e um outro Vilmar, que é agrimensor e mora em Cavalcante, fizeram articulações e moveram os marcos territoriais, transformando 80% das terras de Cavalcante em quilombos, conseguindo junto aos órgãos públicos que tudo fosse transformado em sitio históricos, até os engenhos I, II e III viraram quilombos (os engenhos estão a poucos quilômetros da sede do município e não serviriam como esconderijo para os povos antigos). Nós estamos vivendo uma situação muito estranha. É muita bandidagem, são muitos ladrões em uma cidade só, nós estamos sendo agredidos dentro de nossa terra. São muitas coisas erradas. Eu tenho muito para falar, basta a justiça ser feita e ouvir quem precisa ser ouvido.” Diz em áudio dona Olinda Abreu.
Já o professor José Vieira aponta que sua ascendência familiar em Cavalcante vem desde 1858, iniciada pelo seu tataravô, José Vieira da Silva, por isso ele, como descendente, tem muita preocupação com os rumos tomados no município, principalmente na questão “escravização” feita por várias associações, que segundo ele, têm CNPJ diferentes, mas são dominadas pelo mesmo grupo de pessoas.
José Vieira afirma que, enquanto os líderes das Associações estão “comendo caviar”, os associados estão comendo sopa de pedras, passando muitas dificuldades. “Os verdadeiros descendentes de quilombolas estão no sertão, passando necessidades, cozinhando em seus fogões a lenha, calçando chinelinhos. Cavalcante foi fundada em 1736, por Julião Cavalcante, e tem, de acordo com o último censo, 9.740 habitantes, tendo atualmente como capital político a miséria do povo, visto que, quanto mais miséria mais fácil de se manipular. Só que, felizmente, esse povo está começando a acordar e tendo coragem de se manifestar contra essas associações que não respeitam espaços, não respeitam fazendas, não prestam contas de seus ganhos na exploração de Cachoeiras e com guias de turismo, e contra essas lideranças que ditam as regras sem respeitar a liberdade dos outros. Eu mesmo fui vitima desse grupo. Eles dizem que a fazenda Engenho de Santo Antônio, uma fazenda centenária, como outras existentes na região, toda documentada desde 1858, se tornou quilombo. Chegaram derrubaram minha construção, roubaram telhas, em uma falta de respeito e prepotência. Dentro dessas terras consideradas quilombos, as associações têm total domínio, cobram caro toda e qualquer movimentação dentro da área que eles dominam, é uma renda muito significativa, além de todo o dinheiro que arrecadam pedindo pix, pedindo doações, mais não há nenhuma transparência na prestação de contas. O ex-presidente da principal associação, e atualmente prefeito do município, toda vez que alguém questiona e apontar irregularidades, ele apenas diz que tem que ter provas. Mas quem tem que mostrar o que está sendo feito com o dinheiro arrecadado é a associação, para que a comunidade possa saber o que está sendo feito com o dinheiro. Nos moldes que estão agindo, chove para alguns, mas não chove para outros. Como os recursos arrecadados com crédito de Carbono, Kalunga Sustentável, entre outros projetos que envolvem muitos recursos estão sendo usados? Os verdadeiros quilombos são Vão de Almas, Vão do Moleque e Contenda, que são lugares afastados. O engenho de Santo Antônio, por exemplo, é uma fazenda que está próxima da cidade e os escravos jamais iriam fugir para perto da cidade. Muita coisa precisa ser esclarecida e desmascarada dentro dessa situação que coloca toda uma etnia em cheque.” Relata o professor José Vieira da Silva.
O QUE DIZ O OUTRO LADO
A reportagem do Jornal O VETOR entrou em contado com o presidente da Associação Quilombola Kalunga (AQK), Jorge Moreira de Oliveira, que é chamada de Associação mãe, a cabeça das principais associações no território.
Questionado sobre as várias denúncias apresentadas, o presidente da AQK afirma que essas denúncias existem há vários anos, feitas por pessoas que são contra o trabalho da AQK, mas que, desde o inicio da pandemia a Associação tem auxiliado a comunidade, entregando todos os benefícios e doações que chegaram, desde o álcool em gel até a alimentação.
Ele afirma que a AQK foi criada em 1999, e que desde sua criação vem enfrentando denúncias, mas que ninguém nunca provou nada do que apontam.
“O território é formado por 39 comunidades, tudo que fazemos na Associação está registrado. Dentro dessas 39 comunidades existem aqueles pessimistas que só acusam, mas nos momentos de dificuldades não aparecem para ajudar.” Relata Jorge Moreira.
Sobre as denúncias de alteração da localização dos marcos territoriais, que possibilitou anexar terras documentadas como quilombo, para ficar sob o comando da Associação, Jorge Moreira afirma que não sabe nada sobre esses marcos territoriais, emendando que isso é contra a lei e que quem está denunciando isso deve ter provas e procurar a justiça, e que nunca ouviu ninguém das diretorias anteriores falar sobre retirada desses marcos. “Se alguém tirou, foi o Incra ou algum fazendeiro, mas a Associação não. Até os anos 1990, quase todas as comunidades quilombolas Kalungas dos municípios de Cavalcante, Teresina e Monte Alegre de Goiás viviam sob o jugo de fazendeiros. Eu mesmo presenciei Kalungas saírem amarrados e tocados pela polícia. Por isso em 1999 se teve a ideia de criar uma Associação mãe, e amenizar o sofrimento do povo quilombola. A AQK conseguiu, com a ajuda dos governos estadual e federal, acabar com isso, e hoje quem usa essas terras é o povo Kalunga, impedindo a destruição da natureza pelos que querem implantar o agronegócio. Alguns realmente nunca foram indenizados, mas o Juarez Aquino tem a terra dele documentada, mas não planta nada lá. A AQK trabalha para apoiar todos os Kalungas, principalmente os mais fracos de situação, que viviam espremidos por fazendeiros. Os que são contra dizem que a Associação os impede de tocar roça, mas o que eles querem é tocar roça com tratores, e isso não é uma decisão da Associação, e sim dos órgãos de proteção ao meio ambiente estadual e federal, a AQK não tem o poder de liberar nenhuma área para desmatamento.” Frisa o presidente.
Jorge Moreira afirma que algumas lideranças quilombolas querem levar empresas para dentro da o território quilombola para exploração de minérios, e que a Associação tem lutado para que isso não aconteça, pois que o que está dentro do território é para usufruto dos descendentes quilombolas.
Perguntado sobre a venda de áreas dentro do território quilombola para empresas terem o Crédito de Carbono, Jorge Moreira diz que não tem conhecimento e que nunca nem ouviu falar sobre isso. Ele diz que pode ser que isso tenha acontecido em outra gestão há muito tempo, e que em sua gestão isso não acontece.
Sobre a denúncia de que os principais atrativos turísticos estão em terras particulares, são explorados pela AQK e que, além de não haver prestação de contas dos recursos arrecadados, nada é investido no apoio as comunidades, como manutenção de estradas, assistência social, plantio e colheita, principalmente em momentos de calamidade como os enfrentados nesse momento, e que esses recursos são usados apenas nos interesses dos dirigentes das Associações, o presidente da Associação afirma que “essa história é um pouca comprida. Essas Cachoeiras estavam sob domínio do estado e foram repassadas para serem administradas pela AQK. Tem a Cachoeira Santa Bárbara e a Cachoeira Candaru, que estavam dentro de áreas particulares, e existe a Cachoeira Capivara, a Cachoeira Guardião e a Cachoeira do Prata, que estão dentro do território Kalungas, mas estão sendo exploradas por pessoas de fora. A Cachoeira Santa Bárbara tem uma Associação específica, a Associação Kalunga Comunitária do Engenho II (AKCE), que cuida dela e é responsável por toda a estrutura de receber os recursos, cuidar do local e orientar os visitantes. Desse dinheiro arrecadado na Santa Bárbara, 10% é repassado para a AQK, para que se possa percorrer o território, viajar a Brasília ou Goiânia em busca de melhorias e também para manutenção do escritório em Cavalcante, onde se atende todas as demandas dos Kalungas, 5% é repassado para a Associação Kalunga de Cavalcante (AKC), 15% é destinado para cuidar da saúde de todos os Kalungas moradores dentro do território, onde alguém precisa, ele é socorrido.” Detalha Jorge Moreira.
O presidente da AQK apontou diversas realizações conquistadas em favor da comunidade quilombola. Segundo ele, 450 famílias foram cadastradas para receber créditos de aproximadamente 5 mil reais, fomento, e o fomento mulher junto ao Incra, e outras 650 famílias estão sendo cadastradas gradativamente, para que possam investir em suas áreas; e que também conseguiu junto ao governo do estado, cheques para reformas de moradias e também novas moradias.
Questionado se a família que é associada, que é cadastrada na Associação e mora dentro de uma área dentro do território, se a terra pertence a essa família ou pertence a Associação, e se essa família pode dividir essa terra com seus parentes, Jorge Moreira diz que o território Kalunga é Coletivo, e que isso não é uma lei feita pela AQK, e sim um regimento da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ, e de órgãos do governo federal. Ele acentua que as famílias têm o direito de morar, construir, e de dividir com seus parentes, desde que sejam descendentes de quilombolas, mas não podem vender nenhum pedaço de terra dentro do território, e que o território é dos Kalungas e nada nem ninguém pode impedir os kalungas de morar ou plantar roças dentro dele.
Sobre as denúncias que apontam ex-diretores da Associação como proprietários de grandes áreas dentro do território, Jorge Moreira diz quase todo o território Kalunga está sob responsabilidade da Associação, mas que existe uma grande quantidade da área que está no nome de fazendeiros que não foram indenizados, e por isso “ainda” não foi desapropriado.
“As terras que estão em nome da AQK, quando um Kalunga precisa fazer a sua moradia, ele vem até o escritório da Associação e faz um requerimento de responsabilidade, porque se houver um crime ambiental ali dentro, ele será responsabilizado. Não negamos espaço dentro do território para quem é comprovadamente Kalunga, porque as terras são dos Kalungas. Dentro de sua área a família pode plantar roça de toco, mas não pode desmatar. Pode criar seus animais, plantar, só não pode vender a terra. A Associação não tem poder de autorizar desmatamento, é duro tocar roça de toco, mas é a lei federal. Se quem mora dentro do território quiser gradear ou desmatar algum pedaço, tem que procurar a Secretaria Municipal de Meio Ambiente ou a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e conseguir a autorização. Quero voltar aqui lá na questão do uso do dinheiro arrecadado pela Associação. Ele é usado também para arrumar estradas, como aconteceu em 2019, quando alugamos maquinários e abrimos 11 km de estrada na serra para tirar as comunidades moradora da Terra Vermelha e do Mochila do isolamento, e também para auxiliar, sempre que pode, os organizadores dos principais festejos dentro do território.” Destacou o presidente da AQK.
Perguntado se a AQK teria condições de adquirir maquinários para auxiliar as prefeituras na manutenção das estradas dentro do território, Jorge Moreira diz que não há recursos disponíveis para isso no momento, mas que há a intenção de um dia conseguir realizar isso.
Citado em áudios e vídeos, o Jornal O VETOR fez contato com o senhor Durval Fernandes Mota, apontado pelo presidente da AQK como assessor da Associação desde antes de ela ser formalizada. Segundo Jorge Moreira, Durval Mota foi quem ajudou a abrir portas em vários órgãos federais como a Fundação Palmares, Incra, gabinete de deputados, etc. e que é um homem dedicado a ajudar as comunidades quilombolas.
Por telefone, Durval Mota afirmou não ter conhecimento de retirada de marcos territoriais para expansão do território quilombola. Ele lembrou que, o que houve foi o cumprimento de uma sentença de em uma ação discriminatória, onde se teve a situação fundiária da região regularizada.
O evento, realizado em 2017, contou com presença do governador em exercício, José Eliton (o governador era Marconi Perillo), do então presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), desembargador Gilberto Marques Filho, entre outras várias autoridades, marcando o encerramento da ação discriminatória iniciada em 11 de dezembro de 1986 relativa aos territórios.
Em pesquisa realizada pela reportagem do Jornal O VETOR, foi encontrado texto que diz que a sentença que decretou como devolutas as áreas demarcadas previamente nos municípios foi proferida pelo juiz Eduardo Tavares dos Reis, em janeiro de 2015, e que a medida considerou como públicos os lotes citados, visando a regularização fundiária de Cavalcante, Teresina de Goiás Monte Alegre de Goiás e Colinas do Sul. Na época, o magistrado destacou que a ação discriminatória na comarca remontou à década de 1980 e seu tramite atrapalhava o progresso econômico da região.
Durval Mota lembra ainda que, quem tinha posse dentro das terras consideradas devolutas e devolvidas ao Estado, a documentação tem valor zero, pois a sentença dada foi definitiva.
Em relação a fala do senhor Juarez Aquino no vídeo divulgado em redes sociais, Durval Mota diz que ele foi titulado pelo estado de Goiás quando começou, há aproximadamente 33 anos, a luta dos Kalungas pela terra, e que se ele não usou e não usa sua terra, só diz respeito a ele, pois ninguém o impede de trabalhar dentro de suas terras, hipotecar, comprar máquinas, fazer o que ele quiser porque ele tem um titulo definitivo emitido pelo Estado de Goiás. Durval diz ainda que, como Juarez Aquino, na região do Vão do Moleque existem mais uns cinco ou seis moradores da mesma situação, ou seja, têm os seus títulos definitivos.
Durval Mota cita ainda que as famílias que moram dentro do território são todas administradoras da Associação mãe, a AQK, como consta no Regimento Interno – AQK (Clique no link e leia a íntegra), aprovado pela maioria, em 14 assembleias locais, realizadas com participação de mais de Um mil Kalungas, onde foram definidos os delegados, em debates que duraram 3 dias, e que todos tiveram oportunidade de colocar suas opiniões, inclusive o senhor Bertolino Moreira, o Boto, que pregava a posse individual, indo contra a decisão nacional determinada pela Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ.
Sobre a falta de transparência na prestação de contas do dinheiro arrecadado pela Associação Kalunga Comunitária do Engenho II (AKCE), Durval Mota cita que “Tempos atrás houve uma demanda do Ministério Público Estadual com a AKCE, em que a doutora Úrsula Catarina Fernandes da Silva Pinto, titular da Promotoria de Justiça de Cavalcante, exigiu a apresentação dessa prestação de contas feita pela AKCE, no entanto a advogada da Associação mostrou que não havia amparo legal para tal exigência. Houve assembleias que duraram até uma semana para discutir esse tipo de assunto que só diz respeito a eles. Qual é a empresa que fica dando satisfação de sua movimentação financeira pra todo mundo?”. Argumenta Durval Mota.
Lembrado que, quem está cobrando transparência no uso dos recursos são os próprios associados, já que o presidente da AQK, Jorge Moreira, apontou a porcentagem da distribuição, e que é preciso saber em cima de qual valor vem essa porcentagem relatada por Jorge Moreira, Durval Mota diz que quem quiser saber é só ir até os dirigentes da AKCE, que eles darão os esclarecimentos.
Questionado se não seria mais fácil a AKCE ter um site, um portal ou um modo de dar transparência sabre o valor exato arrecadado e o que sobra depois da distribuição, e se não seria essa falta de transparência com o dinheiro movimentado, Durval Mota argumenta que “não é nada disso, a luta pela terra é que tem provocado isso. Porque a Olinda (Abreu) tem direito de receber do Estado as benfeitorias que ela construiu lá dentro, mas a terra é devoluta e tem que ser devolvida para o povo Kalunga. Por isso tem os processos contra ela, abertos pelo então presidente da AQK, Vilmar de Souza. Já no caso do Vieira, que é uma história controversa, e se não me engano, também tem uma ação possessória em andamento, se ele tiver condições de provar que a terra é dele, isso é com a justiça. A Associação é parte na ação, mas a decisão será do Juiz. Onde ele estava construindo a casa, me parece que não é dele e nem dos antepassados dele, é dentro da área de um paulista. Então não se pode chegar e fazer posse na tora, no nariz dos outros. Tem histórias de que essas terras foram vendidas, mas não quero discutir isso, fazer juízo de valor, porque quem vai decidir isso é a justiça. Junto a isso, existem as articulações políticas, que tentam detonar o território Kalunga.” Concluiu Durval Mota.
Não conseguimos falar com o ex-presidente da AQK, e atual prefeito de Cavalcante,Vilmar Souza Costa, pelo telefone 61 – 9 99xxxx63, nem com o perito Vilmar Parreira, citados nesta reportagem, mas o espaço está aberto para qualquer esclarecimento.
Em reposta aos questionamentos feitos pela reportagem do Jornal O VETOR, a Promotoria de Justiça de Cavalcante, através da assessoria de imprensa do MP-GO, nos enviou a seguinte nota:
“A promotora Úrsula Catarina Fernandes da Silva Pinto, titular da Promotoria de Justiça de Cavalcante, esclarece que, da narrativa feita, chegou ao Ministério Público Estadual o relato de dois furtos dos quais a Associação Quilombola Kalunga foi vítima e que já estão sendo apurados pela Polícia Civil. As demais questões são da esfera de atribuição do Ministério Público Federal. Sugere-se, portanto, o encaminhamento dos questionamentos àquela instituição, tendo em vista que a promotora não tem atribuição nem conhecimento dos fatos”.
Os mesmos questionamentos foram enviados a assessoria de imprensa do Ministério Público Federal, que nos enviou a seguinte nota:
“Informamos que as denúncias/representações que chegam ao Ministério Público Federal referente aos quilombolas geram procedimentos de apuração e são investigadas. Recentemente, agosto/2021, o MPF ajuizou Ação Civil Pública (ACP) com pedido de tutela provisória de urgência, para que a Justiça Federal (JF) determinasse, liminarmente, a imediata reintegração de posse de todas as áreas que compõem o território Kalunga e que estivessem sendo invadidas ou esbulhadas. As áreas, ocupadas centenariamente pela referida comunidade quilombola, estão localizadas nos municípios goianos de Cavalcante, Teresina de Goiás e Monte Alegre de Goiás (processo nº 1002560-50.2021.4.01.3506. Justiça Federal de Formosa) – link da notícia: http://www.mpf.mp.br/go/sala-de-imprensa/noticias-go/mpf-ajuiza-acao-para-reintegrar-areas-invadidas-a-comunidade-quilombola-kalunga Quantos aos fatos referentes às Associações referidos, teremos que realizar uma pesquisa em nosso sistema de dados”.
Importante destacar aqui trecho da reportagem que pode ser lida no link acima.
“De acordo com a ACP, as fronteiras do Território Quilombola Kalunga (TQK) já foram reconhecidas e devidamente delimitadas pelo poder público, por meio de lei, inclusive. Após isso, as atividades de delimitação, demarcação e titulação, antes pertencentes à Fundação Palmares, foram transferidas ao Incra que, em 2004, deflagrou processo administrativo para a titulação definitiva das terras reivindicadas pelos Kalungas. Entretanto, o processo administrativo tramitou lentamente e foi arquivado em agosto de 2019 sem conclusão e, dos 262 mil hectares (ha) que integram o território, apenas cerca de 34 mil ha foram titulados definitivamente à comunidade.”
Repetindo o link para a íntegra da reportagem no sitio do Ministério Público Federal. clique aqui.
Nossa missão.
O Jornal O VETOR é um dos veículos de comunicação pioneiros a se instalar e buscar levar a notícia com ética e dedicação para os 21 municípios da região nordeste de Goiás.
Ao se empenhar para ouvir todos os entes envolvidos nessas demandas envolvendo as centenárias comunidades quilombolas de Teresina de Goiás, Monte Alegre de Goiás e Cavalcante, buscamos auxiliar no encontro de um caminho que leve ao entendimento, e acabe com o clima de desavenças entre irmãos.
AOS NOSSO LEITORES: A qualidade no fornecimento da “Internet” em nossa região não é, geralmente, de boa qualidade. Como sempre inserimos vídeos em nossas reportagens, pedimos que aguardem carregar, geralmente eles são partes importantes da reportagem.
Obrigado á todos!!!!
Eu não fui indenizada é minhas terras não eram devolutas! Tenho cadeia dominial é documentos da Paróquia de Nossa Senhora Santana. Tudo que fiz nas minhas terras estas supostas associações queimaram. Minhas terras estão dentro da Fazenda Engenho ll d,. Engenho ll era Fazenda de escravocrata, não
tem como ser quilombo. Santo Antôni
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