INFÂNCIA DESTRUÍDA – ‘A gente deu muito apoio a ela’, diz mãe de criança estuprada que teve filho aos 11 anos.

Menina de 11 anos deu à luz após ter sido estuprada pelo companheiro da avó. O caso ocorreu na zona rural de Santa Quitéria, interior cearense. Avó da vítima, mulher do estuprador, ainda a acusa de ser mentirosa em todo canto que chega.

Por Gabriela Feitosa**

A recuperação física de uma gestação indesejada em um corpo infantil é possível, mas envolve grandes desafios e riscos, aponta Mariana Prado, médica ginecologista e obstetra. Na quarta-feira (18), o portal de notícias do g1 revelou o caso de uma menina de 11 anos que deu à luz após ter sido estuprada pelo companheiro da avó. Foi a criança quem revelou o abuso.

Além do estupro sofrido pela criança, ela é acusada por familiares de ser culpada pela situação. “Eu converso bastante com ela. Estou ensinando as coisas. Depois do acontecido, a gente deu muito apoio a ela para que ela não se sinta mal. Já basta a avó dela, mulher do estuprador, acusando ela em todo canto que chega. Ele sempre foi uma pessoa que passou confiança. Ficava difícil desconfiar”, disse a mãe da criança abusada.

O crime, que ocorreu na zona rural de Santa Quitéria, interior do Ceará, repercutiu nacionalmente. A Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE), disse que “segue investigando as circunstâncias de um crime de estupro de vulnerável”.

O g1 conversou com Mariana Prado para entender quais riscos a menina de 11 anos enfrentou e pode enfrentar após a gravidez prematura. A bebê nasceu no dia 13 de setembro.

Menina de 11 anos engravidou após ter sido abusada pelo companheiro da avó, na cidade de Santa Quitéria, interior do Ceará. A bebê nasceu no último dia 13 de setembro. Foto: Alberto Leandro/H/Selecionadas)

“O corpo de uma criança ainda está em desenvolvimento, o que pode dificultar o processo de recuperação total, tanto fisicamente quanto emocionalmente”, disse a médica.

Ainda de acordo com a especialista, biologicamente uma gravidez é possível assim que a ovulação começa, o que geralmente ocorre após a menarca (primeira menstruação), que pode acontecer em algumas meninas a partir dos 8 ou 9 anos – dependendo do início da puberdade.

Imediatamente após a menarca, o útero, ovários e outros órgãos reprodutivos ainda podem estar em processo de crescimento e maturação. Embora a ovulação já ocorra, o sistema reprodutivo continua se ajustando e amadurecendo.

“Uma prova disso é que meninas recém menstruantes lidam com irregularidade do ciclo, justamente pelo ajuste hormonal que acontece até os primeiros 5 anos após a primeira menstruação. O mesmo acontece com a estrutura corporal, com mudanças na massa muscular, gordura corporal e estrutura óssea.”

Ainda conforme Mariana, a maturidade emocional e psicológica também não está completa logo após a menarca. Assim, as mudanças também estão em nível psíquico.

Algumas complicações que crianças e adolescentes podem enfrentar após uma gravidez indesejada são:

– Após o parto, o útero normalmente se contrai e volta ao seu tamanho original. No entanto, em um corpo infantil, esse processo pode ser mais lento e complicado devido à imaturidade dos órgãos reprodutivos. A recuperação completa do sistema reprodutivo pode levar mais tempo e envolve risco aumentado de sangramento pós-parto e até perda uterina.

– Processo cicatricial de cesarianas e partos vaginais complicados: muitas vezes, uma cesariana é necessária em meninas muito jovens devido à falta de desenvolvimento do canal de parto. A recuperação de uma cesariana exige repouso, cuidados médicos adequados e acompanhamento, e cicatrizes físicas podem permanecer. Mesmo em um parto vaginal, o corpo infantil pode sofrer lacerações que levam tempo para cicatrizar.

– Recuperação óssea e muscular: o corpo infantil ainda está em crescimento, e uma gravidez pode causar uma sobrecarga no desenvolvimento ósseo e muscular. Em alguns casos, podem ocorrer complicações como problemas na coluna e na pelve, que podem afetar o desenvolvimento físico a longo prazo.

– Impacto nutricional (desnutrição), problemas hormonais e desenvolvimento psicológico interrompido.

“Infelizmente, muitos casos de abuso infantil ocorrem dentro de casa, perpetrados por familiares ou pessoas próximas. Evitar esses casos é um grande desafio, mas existem várias estratégias e medidas preventivas que podem ser tomadas para proteger as crianças. A prevenção do abuso sexual infantil requer educação, conscientização, sistemas de apoio e ações diretas para criar ambientes mais seguros.”, pontuou Mariana Prado.

Relembre o caso

A menina de 11 anos engravidou após ter sido abusada pelo companheiro da avó, na cidade de Santa Quitéria, interior do Ceará. A bebê nasceu no dia 13 de setembro. Em nota, a Polícia Civil do Estado do Ceará (PCCE) disse que está investigando o caso.

Ao g1, a mãe da vítima disse que foi a menina quem revelou que havia sido abusada pelo homem. A mãe começou a desconfiar da gravidez por causa das mudanças no corpo da criança e porque os absorventes que ela comprava para a filha não estavam sendo usados.

Um teste de gravidez, antes mesmo do ultrassom, revelou que a menina esperava um bebê: “Ela ficou nervosa, apavorada. Disse que não tinha feito nada, não tinha ficado com ninguém. No dia 21 de agosto fizemos um ultrassom. Quando fizemos, o médico falou que podia acionar a polícia. Ele viu que ela tinha sido abusada e já estava grávida de sete meses”, revelou a mãe.

A família resolveu criar a bebê, embora os parentes tenham pensado em adoção. O suspeito já estava com a avó da criança há cerca de 12 anos, ou seja, antes do nascimento da vítima. Os pais nunca desconfiaram de nada, mas começaram a estranhar quando a menina passou a não querer mais visitar a avó.

“Ele viu a criança nascer, ele viu a criança crescer. Quando ele se juntou com a minha mãe, eu estava grávida dela”, disse a mãe da vítima.

A menina de 11 anos sempre foi “muito calada” e nunca apresentou comportamentos “diferentes”, segundo a mãe. Após o caso, a vítima também revelou que foi ameaçada pelo suspeito para que não revelasse o crime. Ela não falou se o abuso aconteceu uma vez ou de forma repetida.

A criança está sendo acompanhada por psicólogos do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) do município de Santa Quitéria. A mãe disse que a menina primeiro revelou os abusos para dois psicólogos e para a delegada que está no caso. Por último, falou para a família.

Já o suspeito nunca mais foi visto pela família. A polícia não informou sua idade ou se ele já é considerado como foragido, embora o g1 tenha questionado. A polícia disse apenas que “segue investigando as circunstâncias de um crime de estupro de vulnerável”. As investigações estão a cargo da Delegacia Municipal de Santa Quitéria.

Relação familiar abalada

A relação da família ficou abalada após o caso vir à tona. A mãe da menina disse que a avó não acredita no abuso e que, por vezes, chama a criança de mentirosa. Elas estão afastadas.

“Eu não queria a criança no começo porque achei que ia fazer mal a ela. Fiquei muito revoltada com o que aconteceu. Conversando com psicólogos, entendi que a bebê não tem culpa e ela (a vítima) também não tem. Ela é uma criança, só tem 11 anos. Até então, são duas crianças”.

A comunidade onde a família mora fez uma campanha para arrecadar itens para ajudar as crianças. A mãe tem, além da menina de 11 anos, outros cinco filhos. O pai da vítima também está abalado.

“Eu converso bastante com ela. Estou ensinando as coisas. Depois do acontecido, a gente deu muito apoio a ela para que ela não se sinta mal. Já basta a avó dela acusando ela em todo canto que chega. Ele sempre foi uma pessoa que passou confiança. Ficava difícil desconfiar”, concluiu a mãe.

***FONTE: g1 CE

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