ESCRAVA SEXU@L – Indígena relata ter sido estuprada por policiais durante nove meses em delegacia.
‘Em razão de evidente cumprimento de pena desumano, cruel e degradante, constata-se que a vítima serviu como escrava sexual’, diz a defesa da vítima na ação que a representa em processo contra o estado do Amazonas.
Por Jônatas Levi*
Uma indígena que relata ter sido estuprada repetidamente em uma delegacia do Amazonas durante nove meses por quatro policiais militares e um guarda municipal está processando o estado por danos morais e materiais. Na ação, ela pede uma indenização de 330 salários mínimos, o equivalente a cerca de R$ 500 mil. Quando foi presa, em novembro de 2022, a vítima havia acabado de dar à luz uma criança, que foi mantida com ela no período em que esteve sob custódia na unidade de Santo Antônio do Içá, no interior do Amazonas.
Por que indígena foi presa?
A prisão aconteceu quando a mulher de 29 anos foi encaminhada à delegacia após uma briga com seu então companheiro. Na chegada, porém, os policiais constataram que havia um mandado em seu nome em virtude de uma condenação a 19 anos e sete meses de reclusão por um assassinato ocorrido em outra cidade. A indígena nega a autoria do crime.

O caso foi revelado pelo portal Sumaúma e confirmado pelo GLOBO, que obteve acesso ao processo em que a vítima detalha os abusos sofridos, reforçados por laudos. Ela desenvolveu um quadro de depressão e, atualmente, precisa de acompanhamento psicológico e psiquiátrico.
O advogado da indígena, Dacimar Souza Carneiro, explica que a condenação que levou a cliente à prisão já havia transitado em julgado, mas que ela não recorreu em momento algum por não saber da existência da denúncia.
Como aconteciam os abusos?
No processo, a vítima destaca que só contou sobre os abusos após ser transferida para o presídio de Manaus e que ainda tinha medo de retaliações. Ela relata que chegaram a ocorrer, por mais de uma vez, estupros coletivos por todos os agentes.
“Em razão de evidente cumprimento de pena desumano, cruel e degradante, constata-se que a vítima serviu como escrava sexual por um longo período de 9 meses e 17 dias nos confins da 53ª Delegacia Interativa de Polícia”, argumenta a defesa na ação.
No relato, a vítima conta que era mantida em um corredor com outros detentos e que um dos policiais chegava à delegacia embriagado, mesmo fora do seu horário de trabalho, e a obrigava a manter relações sexuais. De acordo com o depoimento, as violências aconteciam na parte da noite e, em muitos momentos, o filho dela estava ao lado e presenciava os abusos.
Em outro trecho do processo, a defesa destaca que, logo após dar à luz, a mulher não teve “qualquer assistência médica ou psicológica durante todo o período” de amamentação e que a criança foi “amamentada em meio à podridão do cárcere”, o que seria a “prova cabal do descaso do Estado com a dignidade humana e com a proteção integral à criança e ao adolescente”.

Estado do Amazonas investiga e pede diminuição no valor da indenização
Em nota, a Polícia Civil do Amazonas informou que instaurou procedimento para apurar o caso e que a Corregedoria-Geral do Sistema de Segurança Pública do estado também investiga as acusações. A Polícia Militar do Amazonas também abriu inquérito que, atualmente, está em fase de conclusão.
A acusação contra os policiais e o pedido de indenização da vítima tramitam separadamente. O processo contra os supostos autores dos fatos corre em segredo de Justiça.
No processo, o estado do Amazonas reconhece a necessidade de indenizar a vítima, mas oferece R$ 50 mil. A defesa, porém, manteve o pedido inicial de R$ 500 mil. Ainda não há decisão
**FONTE: O GLOBO