ARREPENDIDO – Bolsonaro provoca ira de líder da greve dos caminhoneiros: “Ele nos traiu”
Wallace Ladim, conhecido como chorão, apoiou o presidente em 2018, no ano da greve, mas se mostrou arrependido.
Wallace Ladim , o ‘chorão’, presidente da Associação Brasileira de Condutores de Veículos Automotores (Abrava), e um dos líderes da greve dos caminhoneiros que paralisou o país por uma semana em 2018 mostrou estar arrependido do apoio dado a Jair Bolsonaro na última eleição presidencial.
O motivo da mágoa é a mobilização do governo federal em aprovar o, projeto “BR do Mar” que tem como objetivo ampliar o uso dos portos nacionais a fim de reduzir a dependência do transporte em rodovias. O projeto foi aprovado pela Câmara dos deputados na última segunda-feira (7) e agora segue para o Senado.
“Se passar no Senado, acabou o transportador autônomo”, projeta Chorão. “A categoria precisa acordar”. O deputado Fausto Pinato (PP-SP) propôs emendas que diminuiriam os efeitos do projeto na classe dos caminhoneiros, mas foi ignorado. Acusando o executivo e o relator do projeto de descumprimento de acordo, entregou seu cargo de vice-líder do governo.
“A gente fez campanha para o presidente, nós colocamos faixa nos caminhões, pintamos lona, fizemos camiseta, um trabalho gratuito”, relembra. “Mas percebemos que tudo o que beneficia os caminhoneiros não tem caráter de urgência, enquanto o que é bom para os grandes empresários tem prioridade”.
O presidente da associação e líder da greve declarou que iniciará uma articulação para que os caminhoneiros tenham uma resposta ao projeto, podendo até mesmo haver uma mobilização.
Por fim, declarou que Bolsonaro não demonstra ser um homem de palavra:
“Com o que sei hoje, não apoiaria a eleição de Bolsonaro. Fui criado dentro da ideia de que o homem tem que ter palavra”.
O que é o projeto “BR do Mar”
“Tramita em caráter de urgência na Câmara dos Deputados o projeto que estabelece um marco legal para cabotagem no país, como é chamado o transporte de cargas entre portos ou pontos da mesma costa de um país. Chamado informalmente de “BR do Mar”, o programa busca aumentar a oferta da cabotagem no Brasil, incentivar a concorrência, criar novas rotas e reduzir custos. O projeto foi incluído na pauta do plenário da Câmara dos Deputados na terça-feira (29) mas não chegou a ser analisado.
O transporte marítimo de bens pela costa brasileira tem crescido cerca de 10% ao ano, segundo o Ministério da Infraestrutura, mas a pasta quer alavancar esse número para em torno de 30% ao ano. “Com o programa BR do Mar, vamos equilibrar a matriz de transporte, nos libertar de determinadas amarras, aumentando o uso de embarcações afretadas, reduzindo custos e burocracia, além de aumentar a oferta e incentivar a concorrência”, disse o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, em nota.
A meta oficial é passar de 1,2 milhão de TEUs (unidade equivalente a 20 pés) de contêineres transportados por ano para 2 milhões de TEUs até 2022. Outro objetivo é ampliar em 40% a capacidade da frota marítima dedicada à cabotagem nos próximos três anos, excluindo as embarcações dedicadas ao transporte de petróleo e derivados. Os dados são do Ministério da Infraestrutura, principal autor do projeto.
O que diz o texto
Para estimular a cabotagem, o projeto permite que Empresas Brasileiras de Navegação (EBNs) que detenham frota nacional de navios possam alugar navios estrangeiros para ampliar suas operações e reduzir seus custos, já que a legislação atual obriga que as EBNs encomendem a construção de navios de estaleiro nacional.
O afretamento (aluguel) de navios estrangeiros poderá ser feito para substituir embarcações que estiverem em reparo ou construção; para atender operações que ainda não existam; e para cumprir exclusivamente contratos de longo prazo. O objetivo, diz o Ministério da Infraestrutura, é aumentar a frota em operação no país e, consequentemente, a cabotagem.
Novos entrantes ou empresas de menor porte sem embarcações próprias também serão beneficiadas com as novas regras. Eles poderão alugar navio com bandeira brasileira sem a necessidade de lastro em embarcações próprias.
O texto também prevê a possibilidade de empresas estrangeiras utilizarem os recursos do Fundo da Marinha Mercante para financiarem a docagem (manutenção) de suas embarcações em estaleiros brasileiros. Segundo a Infraestrutura, o objetivo dessa ação é fomentar a indústria naval, em especial no segmento de manutenção e reparos, além de trazer maior escala para as operações dos estaleiros.
“Em relação aos portos, o projeto permite que as empresas fechem contratos temporários para a movimentação de cargas que ainda não têm operação nos terminais portuários. A medida visa agilizar a entrada em operação de terminais dedicados à cabotagem.
Por que o governo quer incentivar a cabotagem
O governo quer criar a chamada “BR do Mar” para reduzir o custo logístico e estimular o desenvolvimento da indústria naval nacional. É o que escrevem os ministros Tarcísio, Paulo Guedes (Economia) e Jorge Oliveira (Secretaria-Geral) na justificativa do projeto enviado ao Congresso. O texto é considerado prioritário pelo governo e está dentro os diversos marcos legais que podem ser aprovados ainda em 2020.
Os ministros lembram que, embora o Brasil seja um país continental com quase 8 mil quilômetros de costa, a movimentação de carga por cabotagem representa apenas 11% de participação na matriz logística. Para efeitos de comparação, as rodovias são responsáveis por 65% do total das cargas transportadas. Com isso, o país fica refém de um único modal, que pode ser paralisado por greves de caminhoneiros, por exemplo, e não é o ideal para longas distâncias.
“É cediço [sabido], entretanto, que o uso excessivo do modal rodoviário em longas distâncias implica em baixa produtividade no transporte de cargas, aumento nos custos de frete, super utilização desnecessária da infraestrutura rodoviária, gerando gastos expressivos para a União com manutenção das vias e viabilização de novas rotas, além de trazer consigo estatísticas negativas decorrentes dos altos índices de acidentes e mortes no trânsito causados por caminhões e índices também elevados na emissão de e poluentes”, dizem os ministros.
O transporte marítimo, afirmam, é “comparativamente mais eficiente e de menor custo que o modal rodoviário ou ferroviário, pois possui como característica natural a desnecessidade de aportes de recursos públicos para viabilização da via, além de proporcionar maior segurança para o usuário do serviço, para a carga transportada e menor impacto ambiental”.
“Deste modo, para incrementar a participação da cabotagem na matriz logística do Brasil e, consequentemente, para otimização do escoamento das cargas que abastecem o mercado interno brasileiro, de forma equilibrada e eficiente, é imprescindível a criação de uma política específica para o transporte de cargas por cabotagem, que garanta segurança regulatória para o transportador e confira confiabilidade ao usuário na eficiência do modal aquaviário”, concluem os ministros.
Foto:Diego Baravelli/MInfra