Água: a integração nacional
Jacqueline Vieira*
A crise de água que assola o Sudeste brasileiro é alvo de um dos mais importantes debates da atualidade. Vários são os
argumentos para apontar os culpados, cada qual com suas defesas e bandeiras políticas. Também tentaram culpar São Pedro por fechar a torneira celeste. Mas a verdade é uma só: o homem, em sua ação predatória constante e prolongada, é o responsável pela escassez dos recursos hídricos.
E este não é um fenômeno isolado. Mais precisamente, uma consequência do desmatamento, do aterramento de nascentes, da destruição de matas ciliares, da impermeabilização do solo, de obras em áreas de recarga aquífera, de planos diretores que não contemplam as necessidades ambientais do ambiente urbano. Modelos de irrigação ultrapassados também contribuem para um desequilíbrio na disposição hídrica para os seus múltiplos usos. O volume de água desperdiçada entre a estação de tratamento e a torneira do consumidor, que ultrapassa os 40% de toda a água tratada no Brasil, também figura como um desafio a ser vencido se quisermos continuar sendo abastecidos de forma contínua e ininterrupta.
Recentemente um estudo do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpe) mostrou que o desmatamento na Amazônia contribui para a redução do volume de chuvas no Centro-Oeste e Sudeste. Mais uma prova do “efeito borboleta” que ações pontuais refletem em outras regiões.
As consequências da falta de água são muito maiores do que podemos imaginar. No caso de São Paulo, os reflexos são sentidos em todo o país. Indústrias não conseguem cumprir suas remessas devido à redução da produção causada pela falta de água. O comércio não consegue atender seus clientes, o desemprego aumenta, a economia desacelera, os preços sobem, a fome aumenta, a violência se expande, doenças se proliferam.
O Grupo Intergovernamental de Estudos sobre Mudança Climática (GIEC) previu, em fevereiro deste ano, um aumento de 1,8°C a 4°C na temperatura média do planeta até 2100. Os cientistas ainda estimam que um aumento de 2ºC poderia resultar em até dois bilhões de seres humanos com escassez de água. Do total, de 350 a 600 milhões estariam na África e de 200 milhões a 1 bilhão na Ásia.
Para mitigar esse futuro tão preocupante, ao contrário de algumas soluções muito impactantes e pouco eficientes que têm surgido, a única saída é recuperar as áreas degradadas, proteger as nascentes, as bacias hidrográficas, as áreas de recarga aquífera as calhas e margens dos rios. Comitês e planos de bacias hidrográficas estão sendo criados e fortalecidos para melhorar a gestão das águas, mas é preciso empoderar estas instâncias para que as políticas de preservação se efetivem.
*(Jacqueline Vieira é secretária do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Estado de Goiás)