ENTREVISTA – Raquel Lima, Ativista do movimento social em defesa da reforma agrária.

Reforma agrária, agricultura orgânica e cooperativismo estão entre os temas abordados na entrevista. Raquel Lima fala também sobre a ANU – Ação Nacional Unificada, que visa a união dos movimentos sociais trabalhadores sem terra, associações e agricultores familiares.

Elias Alves de Souza

Raquel Lima, Ativista do movimento social em defesa da reforma agrária.

Faltando menos de quinze dias para findar o prazo estipulado pelo Juiz Federal Eduardo Cubas, que determina saída pacífica do “povo sem terra” das fazendas Cerrado, Fazendinha, São Pedro, Isabel e Cachorro Morto, todas elas localizadas no municio de São João d’Aliança, região nordeste de Goiás, e que foram ocupadas há mais três anos, inicialmente com bandeira da FNL (Frente Nacional de Luta), liderada por Zé Rainha, e depois pela bandeira do MSL (Movimento Social de Luta), Raquel Lima, uma das mais expressivas e influentes lideranças do movimento que busca a sonhada “reforma agrária” na região, se posiciona sobre o tema e outros assuntos.

– Raquel Lima, no limiar do prazo de vencimento de uma ordem judicial, qual a expectativa hoje dos acampados, afetados pela decisão da justiça, na região de São d’Aliança

RL. – O processo de aquisição das terras no Estado do Paraná está bem avançado, a questão da posse da terra nada interfere em sua aquisição. O maior problema maior é a desunião e a criação de vários grupos. Até o presente momento o INCRA reconhece apenas a Bandeira MSL. Para o INCRA isso acaba por favorecê-los, pois antes tinha o compromisso da compra de 5 fazendas no valor de mais de 49 milhões, agora ficou mais fácil, são apenas duas e se torna mais viável diante da realidade política e socialVocê entende realmente que o INCRA cumpre sua função social ou é um mero “vendedor de sonhos”?

R. L. – Sim, o INCRA cumpre. Atender às diferentes demandas sociais e aos grupos de interesse envolvidos no espaço rural exige um grande empenho e tempo. Na minha visão temos impasses que atrasa todo o processo da Reforma Agrária no País:Primeiro, Mesmo com o esforço de muitos diretores do INCRA e também da Ouvidoria Agrária, a política transforma tudo isso em massa de manobra. Precisamos de governantes que estejam compromissados com o povo durante seus quatro anos de liderança e não somente em seu ano eleitoral. Segundo, necessitamos da verdadeira reforma agrária no campo! Hoje o povo brasileiro sonha com seu pedaço de chão e muitos necessitam da terra para sobreviver, mas a realidade vivida em acampamentos é que ainda existe uma grande quantidade que mancha esta visão. O fato de não se organizarem para plantar e comprovar que é do campo dar-se a conotação de estão ali para fazer chácaras de lazer. Se você não vai exercer a função de agricultor, não perca tempo ou muito menos ocupe a vaga de quem precisa!

– No inicio das ocupações em São João d’Aliança, a maioria da população apoiou o movimento, hoje já existe certa aversão, a que você atribui essa mudança de comportamento?

R. L. – Uma pergunta bem capciosa. Talvez tudo tenha se dado através da falta de caráter e ostentação por parte da liderança de Hugo Zaidan. A partir do momento que foi escandalizado e exposto seu envolvimento com várias mulheres acampadas, que chegou a culminar em um filho com E. N., isso trouxe o início do descrédito para aqueles que respeitam sua família e a moralidade. Outro ponto foi o pensamento de rivalidade com o agronegócio, afinal, em 2050 serão 9,1 bilhões de pessoas no mundo, 34% a mais do que hoje, sendo 70% em áreas urbanas. O Brasil tem potencial para ser o principal fornecedor de alimentos do mundo e responder ao aumento da demanda global de importações, e boa parte da produção é oriunda da agricultura familiar, ou seja, a união e a cooperação entre o agronegócio e a agricultura familiar será a chave para os desafios da governança agrária no país

 – O que você pode relatar de aprendizado ao longo de sua vida de luta?

R. L. – Respeito, coragem e dor. Como disse Nelson Mandela “Devemos promover a coragem onde há medo, promover o acordo onde existe conflito, e inspirar esperança onde há desespero.” Respeito para com o povo.

 – Em relação a população de São João d’Aliança, o que você tem a dizer?

R. L. – Somos nós os atores para a transformação, acreditem no potencial da agricultura familiar da região, lutem por estas terras que já pertencem à vocês e aprendam a cobrar com união por seus direitos.

– Nas eleições passadas, você chegou a ensaiar uma entrada na política, ainda existe futuramente essa possibilidade?

R. L. Não. A eleição passada trouxe o novo para São João D´aliança, acredito muito nas novas expectativas e propostas de boa parte vereadores.

– Qual o momento mais tenso, já vivido por você na sua história de luta, sobretudo em São João d’aliança?

R. L. – A desocupação do acampamento Cerrado, com a queima dos barracos e a perseguição por parte do Major Belelli.

– Uma grande alegria e uma grande decepção que você tem a registrar como mulher?

R. L. – Alegria: Saber que estou no caminho certo, que posso contribuir para luta e o sonho de muitos. Hoje sou reconhecida em nível nacional na luta da mulher do campo e pretendo fazer muito mais ainda. É melhor morrer na luta do que morrer de fome! Decepção: Meu companheiro.

ANU – Ação Nacional Unificada: projeto de captação de recurso com a ONU para a mulher no campo.

 Qual o compromisso de Raquel Lima com os acampados hoje?

R. L. – Estou com o projeto da mulher do campo, com a cooperativa CATITU e com a ANU – Ação Nacional Unificada. Em recente oportunidade foi apresentado a Instituição Museu do Futuro, que é ligada a ONU, o Projeto da Cooperativa CATITU, que traz à mulher do campo uma oportunidade de construir sua renda familiar através da fabricação de Conservas de Bambu, minimilho e a produção de seu quintal de forma orgânica e sustentável.  O projeto consiste em que uma mulher é capaz de sustentar sua casa através de um quintal produtivo de 10×20 juntamente com o extrativismo de sua região pelo meio do cooperativismo. Este é o resgate da verdadeira agricultura familiar! Iniciou-se com 04 acampadas mulheres e 01 homem, sendo Maria José, Cássia, Elita, Eliane e Pedro Paulo. Através de uma cultura familiar minha, trouxe para eles a experiência da fabricação de conservas de Bambu, e com a excelente aceitação no mercado, tomou forma e venho expandindo para outros Estados, que, diga-se de passagem, já estão bem mais avançados do que nós. A Secretaria Estadual de Agricultura Familiar do Estado de Mato Grosso, através do diretor, Corgésio Albuquerque, e Márcia, secretária adjunta da SEAF, propôs a criação de um grupo de trabalho para desenvolver juntamente com a ANU o projeto de captação de recurso com a ONU para a mulher no campo. Estamos falando em um trabalho em nível nacional, que se iniciará no Mato Grosso e Goiás com um montante de mais de três milhões a serem investidos em capacitação e infraestrutura. O outro projeto que estou desenvolvendo é a ANU, que é a união dos movimentos sociais trabalhadores sem terra, associações e agricultores familiares em prol de uma força maior para representar e defender, de forma coletiva ou individual, fortalecendo a produção e seu escoamento, bem como as políticas públicas e a economia solidária. Hoje estamos em 10 Estados, com mais de 18 bandeiras de movimentos sociais e representamos mais de 50 mil famílias.

 

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2 comentários em “ENTREVISTA – Raquel Lima, Ativista do movimento social em defesa da reforma agrária.

  • 26 de março de 2019 em 14:23
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    A Raquel está bem diferente na foto. A Raquel que conheci vivia na academia e junto aos famos, se tiver uma mudança verdadeira é o povo quem ganha.

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